LUANDA (O SECRETO) – Num momento em que o continente africano revisita os fantasmas do seu passado e enfrenta os desafios do seu presente com um futuro ainda por se definir, afirma, Benedito Daniel, presidente do Partido de Renovação Social, PRS, em declaração a imprensa no Fórum da Juventude Africana, realizado recentemente em Luanda.
O responsável do PRS, lançou duras críticas à persistência do neocolonialismo em África e apelou à juventude para que assuma o papel de protagonista na redefinição do destino africano.
“A independência foi conquistada, mas continuamos colonizados”, disse Daniel, num discurso que soou mais como um alerta do que como mera análise. Segundo ele, o continente permanece submisso a mecanismos internacionais de dominação económica, cultural e política, que perpetuam a dependência estrutural dos Estados africanos.
Neocolonialismo: A nova escravidão silenciosa
A denúncia de Benedito Daniel não é nova, mas ganha força pelo contexto em que foi feita. O Fórum da Juventude Africana reuniu vozes jovens de várias partes do continente, num esforço para pensar África a partir de África. Daniel destacou que a verdadeira independência só será alcançada quando os jovens africanos compreenderem que o neocolonialismo é tão perverso quanto o colonialismo tradicional, mas infinitamente mais sofisticado. “É uma questão africana, e quando é descoberta por jovens, melhor ainda”, disse, com um tom de esperança e advertência.
Para o líder do PRS, o continente vive uma colonização disfarçada: são as dívidas impagáveis, os acordos comerciais desequilibrados, a exploração dos recursos naturais por multinacionais estrangeiras, e a importação acrítica de modelos de desenvolvimento que ignoram as realidades locais. “A luta de hoje é contra o domínio que se apresenta como ajuda. É preciso consciência para distinguir a mão estendida da algema disfarçada”, afirmou.
Pan-africanismo: Um sonho abandonado ou por reconstruir?
Daniel também fez uma leitura crítica da história recente de África. Para ele, os ideais do pan-africanismo — que inspiraram movimentos de libertação e a solidariedade intercontinental — foram deixados de lado pelas elites políticas que sucederam os regimes coloniais. “Os ideais que libertaram os nossos povos foram traídos por aqueles que, uma vez no poder, escolheram o conforto da submissão ao preço da soberania”, criticou.
No entanto, há, segundo ele, uma nova luz: o surgimento de uma juventude africana que redescobre esses ideais com um olhar renovado. Jovens que, além de celebrar a cultura africana, exigem políticas públicas inclusivas, educação de qualidade, oportunidades económicas reais e representação política efetiva. O pan-africanismo, defende Daniel, não pode ser apenas uma memória nostálgica. Precisa ser atualizado como projeto político, económico e ético para o século XXI.
Juventude: Força desperdiçada ou capital transformador?
Benedito Daniel foi enfático ao traçar um retrato do que considera ser uma das maiores contradições de Angola e de muitos países africanos: a juventude como maioria demográfica, mas minoria no acesso ao poder, à renda e às oportunidades. “O nosso país é jovem, mas tem uma juventude desamparada, desempregada e desencorajada. Se não cuidarmos dela, não haverá amanhã para Angola”, alertou.
Segundo dados não oficiais mencionados pelo político, o desemprego juvenil em Angola ultrapassa os 60%, com impacto direto sobre o crescimento do crime, da informalidade e da emigração clandestina. Para enfrentar esse cenário, Daniel propõe uma viragem radical nas políticas públicas: promover o empreendedorismo, descentralizar oportunidades, estimular a educação técnica e criar ecossistemas locais de desenvolvimento. “Precisamos desafogar Luanda e dar vida às províncias. A juventude não pode ser forçada a migrar para sobreviver”, defendeu.
Um apelo à coragem de romper
Num dos momentos mais filosóficos da sua intervenção, Benedito Daniel citou um cientista africano: “O desejo fala mais alto do que a tradição”. Para o político, muitos dos obstáculos ao progresso africano estão enraizados em tradições que já não servem aos tempos actuais, sejam elas culturais, políticas ou institucionais. “É preciso coragem para romper com aquilo que nos impede de avançar, mesmo que seja antigo, respeitado ou confortável”, afirmou.
O apelo final de Daniel foi abrangente, Chamando os políticos, igrejas, líderes comunitários e famílias a assumirem responsabilidade coletiva pelo futuro da juventude africana. “Não podemos continuar a atrasar o futuro com discursos vazios, o que está em jogo não é apenas o amanhã, é o agora. E o agora exige ação”, concluiu.