LUANDA, (O SECRETO) – A discussão do pacote legislativo eleitoral, iniciada esta semana n as Comissões de Especialidade da Assembleia Nacional, revela não apenas a urgência de revisão das normas que regerão os próximos pleitos eleitorais, mas também escancara as fragilidades de um sistema político ainda resistente ao pluralismo e à participação cidadã.
Em declarações contundentes, o Grupo Parlamentar da UNITA denunciou a falta de abertura no processo e apelou à inclusão efetiva da sociedade civil, igrejas e parceiros sociais nas discussões parlamentares em curso.
O pacote em debate visa revisar normas fundamentais como a Lei Orgânica das Eleições Gerais, Lei do Registo Eleitoral Oficioso, e a Lei sobre a Comissão Nacional Eleitoral (CNE). A sua aprovação terá impacto direto na qualidade da democracia angolana, na legitimidade das eleições de 2027 e na confiança pública nas instituições. Para a UNITA, a exclusão de propostas da sociedade civil e a condução dos debates de forma limitada representam riscos graves para a estabilidade política e para o fortalecimento do Estado Democrático e de Direito.
“Estamos a discutir o futuro da democracia em Angola, a sociedade civil tem propostas, tem voz e tem legitimidade, ignorá-la é trair o espírito democrático e comprometer a credibilidade do processo eleitoral”, afirmou Emmanuel Bianco, diretor do Gabinete de Comunicação da UNITA.
Movimento Cívico “Mudei” denuncia exclusão e ameaça acionar mecanismos constitucionais
Entre as organizações civis que se manifestaram contra a condução do processo, destaca-se o movimento cívico Mudei, que afirma ter submetido à Assembleia Nacional uma proposta de reforma eleitoral há mais de dois meses, sem que tenha havido qualquer resposta formal ou notificação para participação nos debates.
“O nosso dossiê foi entregue atempadamente, mas fomos ignorados. Nem um email recebemos. Somos parte interessada enquanto representantes da sociedade civil. Este silêncio é inaceitável”, declarou o ativista Jame Domingos, porta-voz do movimento.
Diante da exclusão, o Mudei pondera recorrer a mecanismos legais e constitucionais, incluindo a interposição de providências cautelares, como forma de pressionar o Parlamento a considerar suas propostas. Segundo o movimento, tratados e convenções internacionais dos quais Angola é signatária garantem à sociedade civil o direito à participação nos processos legislativos de interesse nacional.
Tensões no Parlamento expõem falhas no diálogo político
A tensão no Parlamento angolano ficou visível nas sessões plenárias da última semana, quando debates acalorados e acusações mútuas entre deputados da oposição e da maioria governamental (MPLA) revelaram o clima de desconfiança e dificuldade de construção de consensos.
A presidente da Assembleia Nacional, Carolina Cerqueira, foi acusada por deputados da UNITA de conduzir os trabalhos com parcialidade e de impedir o contraditório em momentos cruciais do debate. O episódio em que o deputado Adriano Sapinãla foi interrompido diversas vezes ao tentar responder a acusações gerou forte reação na opinião pública.
“A presidente da Assembleia agiu com autoritarismo. O Parlamento deve ser um espaço de debate, não de silenciamento”, disse o padre e analista político Celestino Epalanga, no espaço revista de imprensa na Rádio Ecclésia.
O Padre, avança ainda que, a falta de transparência nos procedimentos legislativos e a tendência de exclusão do contraditório não condizem com os princípios de uma democracia sólida. “O que temos visto é um Parlamento que falha em dialogar, que recusa consensos e que marginaliza vozes críticas. Isso fragiliza a confiança popular nas instituições”, completou.
UNITA apela ao patriotismo e ao consenso nacional
Em meio ao impasse, o Grupo Parlamentar da UNITA reforça que permanece aberto ao diálogo e ao consenso, desde que o processo seja plural, justo e verdadeiramente inclusivo. Para o maior partido da oposição, garantir eleições livres, justas, transparentes, competitivas e credíveis é uma exigência patriótica.
“Apelamos a todos os deputados, independentemente da filiação partidária, que coloquem os interesses da nação acima das estratégias políticas. Este é um momento que exige coragem, escuta e responsabilidade”, afirmou Emmanuel Bianco.
A UNITA defende ainda que as organizações da sociedade civil devem ser formalmente chamadas a contribuir com suas propostas e preocupações antes da votação final dos diplomas legais. “Não se pode legislar sobre a democracia à porta fechada. A exclusão não fortalece o Estado, enfraquece-o”, pontuou.
Expectativa da cidadania e o papel da imprensa
Enquanto os debates avançam nas comissões parlamentares, cresce também a expectativa da população e da opinião pública nacional. Organizações cívicas, juristas, lideranças religiosas e cidadãos atentos acompanham com preocupação o desenrolar do processo, temendo que as alterações à legislação eleitoral sejam aprovadas sem o devido escrutínio público e sem representatividade plural.
No entanto, a imprensa e as redes sociais têm desempenhado papel fundamental na fiscalização dos debates, denunciando atitudes autoritárias, incoerências e atropelos regimentais. Resta saber se o Parlamento estará à altura do momento histórico e se saberá escutar a nação que diz representar.